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Um bom homem come o miolo e joga as cascas para voltar ao lar

quarta-feira, março 31, 2010 Comments Off

Em uma pequena aldeia, seu líder, um senhor de grande idade, adoece e tem sua saúde comprometida cada vez mais, a cada dia que passa.

Com isso, o povo do vilarejo fica inquieto, apreensivo, com medo do destino que sua vila pode tomar sem a liderança de seu senhor.

Nos seus últimos dias, no fim de uma manhã, ciente da preocupação que tomava conta de sua pequena aldeia, o senhor decide caminhar um pouco para tentar acalmar seu povo, e chama alguns de seus mais nobres homens para acompanhá-lo. Eles aceitam, obviamente, também preocupados que possa acontecer algo com seu senhor durante o longo percurso que ele estava disposto a percorrer.

No meio do caminho, depois de pouco tempo andando, o senhor pára em frente ao que deveria ser o início de uma das florestas que circunda a aldeia, e anda em direção a ela.

“Mas, Senhor, essa floresta nós nunca exploramos.”

“Mas eu gostaria de caminhar por aqui.” E assim eles o seguem.

Já no fim da tarde, o sol se põe, e o Senhor acende sua tocha para que eles possam continuar sua caminhada. Depois de um longo caminho percorrido para dentro da mata, o senhor começa a sentir grande cansaço e dores em suas pernas, que o obrigam a parar para descansar. Seus homens se afligem largamente, temendo que o pior acontecesse a seu líder, e tentam, assim, aliviar suas dores e repor suas energias.

Apesar de todos os esforços de seus homens, o senhor se sente pior a cada minuto que passa, não obtendo forças para guiar seus homens para fora da mata novamente. Assim, um deles tem uma grande idéia.

“Senhor, dê-me sua tocha, para que assim eu possa encontrar nosso caminho para fora dessas árvores, enquanto nossos homens te carregam seguindo-me.”

E o senhor se negou a entregar-lhe sua tocha.

“Mas, senhor, se não o fizer, nós nunca sairemos daqui.”

“Desculpe-me, meu homem, mas minha tocha não posso lhe entregar.”

E assim, outro teve outra diferente idéia.

“Senhor, poderia então me dizer onde encontrar uma tocha aqui nesta mata, já que a conhece tão bem, para que assim eu possa levar nossos homens para fora daqui.”

O senhor abre um grande sorriso, e responde-lhe.

“Isso eu também não posso fazer.”

Antes que o homem pudesse questionar seu líder, outro homem já se pronunciava, com o peito cheio e a voz límpida de quem havia matado a charada.

“Senhor, carregar-te-ei em minhas costas, e o senhor nos guiará para fora dessa terra sem fim.”

O senhor abre um sorriso ainda maior que o anterior e diz, com a voz já fraca das dores que sentia e da força que perdia.

“Isso, meu homem... Isso eu nunca faria também.”

Seus homens ecoam reprimendas pela floresta, perplexos com a atitude de seu líder que, a essa altura, já queriam abandonar ali, mas não o faziam porque tinham medo da floresta desconhecida que não sabiam como abandonar, e então decidiram ficar ali, à espera do amanhecer para, então, encontrar o caminho novamente. Mas a cada hora que passava, a fome apertava seus estômagos vazios cada vez mais, se tornando impossível ignorá-la.

Assim, no meio da noite, um dos homens do senhor entra na mata, abandonando o grupo. Os outros homens, ao notar sua ausência, riem e chamam-no de covarde e egoísta. Mas com tamanha fome, alguns já começam a considerar a idéia de fazer o mesmo, e abandonar o grupo em busca de comida antes que outros fizessem o mesmo.

Depois de a fome torturar-lhes por uma hora, os homens vêem uma pequena luz no meio das árvores se aproximando rapidamente, fazendo grande barulho por sobre as folhas caídas, e se preparam para atacar quando, então, notam ser o desertor voltando, agora com uma tocha feita de lenha e de parte de sua própria roupa. Ele, então, vira para o senhor e lhe diz, sem qualquer cautela:

“Senhor, agora tenho uma tocha e não importa o que disseres, irei procurar nosso caminho para fora daqui enquanto outros te carregam, ou seus homens morrerão de fome aqui e suas famílias ficarão desamparadas, e isso eu não quero.”

O senhor, então, levanta-se tranqüilamente e posiciona-se próximo ao homem da tocha.
“Carregar-me não será necessário. Mas, podemos ir, então?”

Os outros homens então, surpresos, questionam.

“Mas, senhor, não estavas machucado e desgastado?”

“Estou velho, mas ainda posso caminhar de volta ao meu lar.”

“Por que não o fez, então?”

“Porque nós precisávamos encontrar nosso novo líder antes que o velho líder morresse de uma hora para outra, sem nunca poder transmitir seus conhecimentos.”

“E por que não me passou sua tocha, para que eu pudesse nos guiar de volta para nossa vila?” o primeiro homem indagou.

“Porque um líder não é alguém que entregamos uma tocha acesa dizendo-lhe ‘lidere’. Um líder é aquele que não hesita em entrar no breu da mata desconhecida em busca de lenha para criar sua própria tocha e liderar seu próprio povo.”

E então o senhor apaga sua tocha no chão, deixando-a ali, e agrupa-se com os outros nobres homens restantes, esperando, então, que o homem com a nova tocha diga-lhes o caminho, para que todos reencontrem o conforto de suas famílias, em sua vila, ordenadamente.
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