Archive for julho 2008

Ele

terça-feira, julho 29, 2008 Comments Off

Como a fumaça de um cigarro que, antes que você sequer perceba, já se dissipou pelo ar sem deixar o menor rastro, além apenas de um gosto amargo que fica na sua lingua e um estranho desejo de fumar novamente.

Sombras da Cidade

quinta-feira, julho 24, 2008 Comments Off

Desde pequeno, sempre tive pequenos medos. Coisas bestas, passageiras. Sempre foi complicado dormir em casas que não fossem a minha. Por mais que tudo corresse normalmente durante todos os dias, era sempre à noite, naqueles longos e aparentemente eternos instantes antes de o sono nos derrubar, quando havia o medo.

Meus amigos e eu sempre acabavamos por entrar nas intermináveis discussões sobre a existência ou não de fantasmas. Sempre havia opinião de qualquer um dos lados da questão. E então havia eu - o que se mantinha em silêncio, se lembrando das sombras desenhadas nas paredes antes de dormir.

Hoje já não penso mais sobre isso. Me acostumei com a existência deles. Vejo-os todos os dias, em vários locais diferentes pelos quais passo todos os dias, religiosamente. E por todos os outros que acabo por ir também. Eles estão em todo lugar.

Hoje um deles estendeu o braço humilde enquanto eu cruzava ao seu lado. Resisti. Como eu disse, já me acostumei com sua existência. Não há nada que eu possa fazer. Apenas evito entrar em conflito, e então está tudo bem.

Antes que eu chegasse em meu escritório, encontrei com vários deles, distantes, ocultos nos cantos das largas ruas da capital paulista. Um menino de prováveis sete anos, uma menina de prováveis catorze, e outra de prováveis dezessete. Prováveis irmãos. Sujos. Sujos. Andavam juntos e então se espalhavam por entre as pessoas no ponto de ônibus, estendendo o braço insistentemente frente a elas que, assim como eu, aprenderam a não olhar.

Fantasmas não existem.

O sinal não abria, e comecei a ficar impaciente porque, lá longe, vi um deles se aproximando diretamente a meu carro. Meu vidro estava aberto pela metade, e isso não era suficiente. Ele era imundo. Seus dreadlocks deviam conter a maior quantidade possível de sujeiras da cidade grande. Sua calça e blusa - as mesmas desde que cruzei esta rua pela primeira vez. Hoje era de mim que ele se aproximava. De repente, me vi novamente deitado sobre a cama que não era minha, numa casa que não era a minha, no escuro, instantes antes de o sono bater. Estava vendo as sombras nas paredes percorrerem em minha direção. Mas dessa vez o sono não iria bater. Eu continuaria acordado, e o fantasma chegaria em mim. Minhas pernas tremiam.

Sua boca horrendamente torta, com sujeiras gosmentas no canto dela, e restos de comida grudados naquela barba grande crespa, e ele olhava diretamente aos meus olhos. Grunhia qualquer coisa de insano, enquanto estendia a mão preta de podridão em minha direção.

Fui firme. "É apenas um fantasma". Apertei rigidamente o botão, ao que o vidro sobe lentamente. E minhas pernas param de tremer. Não tinha mais com o que me preocupar.

"Ele não existe."

"Fantasmas não existem."

De Espaço

quinta-feira, julho 17, 2008 Comments Off

Descobrimos então que ali, naquele cantinho escondido, havia um vazio.
E ali resolvemos guardar nossa alma, com a ingênua certeza de que algo sem conteúdo devesse pertencer a um local inexistente.
Todos os direitos reservados. Tecnologia do Blogger.