Archive for junho 2008

Em Molduras Vazias

terça-feira, junho 24, 2008 Comments Off

Decidiu então comprar uma pintura. Foi direto na mais adequada a ele, larga, espaçosa, cheia de sentimentos. "Magnifico". Levou para casa feliz e na parede da sala pendurou.

Uma semana depois quis destruir. O irritava.

No dia seguinte amava novamente a pintura.

No fim de semana seguinte, o quadro se encontrava na lixeira. Ou os restos de.

Decidiu que aquele não o alegrava o suficiente. Devia haver cores frias em excesso. "Artistas e suas mensagens subliminares...". Comprou outro. Somente cores quentes. Um deserto sob toda a paixão do Sol. "Perfeito".

Em um mês, estava pendurado na parede da larga sala da vizinha pobre. "Cores em excesso. Artista exagerado".

Comprou outro. Outro. Outro. Decidiu no inverno fazer uma fogueira.

A parede então se encontrava vazia novamente. Sentou-se à frente dela e ficou em silêncio. Aguardou.

Decidiu então comprar uma moldura. E a moldura vazia pendurou. E uma televisão velha queimada comprou e na estante principal colocou. E nas paredes do espaçoso quarto, pequenas molduras vazias espalhadas esporadicamente.

"Ok. Agora posso ver e sentir o que eu quiser ver e sentir quando eu achar que deva ver e sentir."

Ele não comprou outras pinturas.

Da Liberdade da Alma

sábado, junho 21, 2008 Comments Off

Um dia, seremos todos andróginos. E então, quando nossos corpos estiverem libertos, a sociedade estará pronta para a liberdade da alma quando, então, deixará de se preocupar sobre "a que" amar, para se preocupar com "a quem" amar.

16''

quinta-feira, junho 19, 2008 Comments Off

Ele tirou então o telefone do gancho, discou um número qualquer, e assim que atenderam, gritou com toda a força que tinha durante dezesseis segundos, até perder o fôlego, e desligar.

Contratempo

terça-feira, junho 17, 2008 Comments Off

Eis que ele, acostumado a acordar pontualmente às 7:00 e ir direto à janela do quarto, onde conseguia ver belamente um Sol recém nascido, no dia de hoje se depara com um imenso vasto de nada no horizonte, ao invés do forte brilho do Sol que tanto gostava de admirar.

Fica confuso e duvida de sua lucidez.

Volta à janela, e ainda nada lá, apesar de a manhã estar tão clara como sempre. Repara então nas sombras que, hoje, surgem no lado oposto ao qual deveria.

Corre para o lado oposto da casa, e escancara a porta, se assustando de imediato com um Sol inesperado. Com urgência, corre até ela na cozinha, que preparava o café, de pé, no exato mesmo lugar e com a mesma serenidade de todos os dias.

- Você está vendo!?

- O quê filho?

- O Sol!

- Sim. Vi sim.

- Mas.. O quê... !? ...

- Isso é Ele desistindo - ela diz, tranqüilamente, enquanto vira o bule sobre a xícara, que serve então a ele.

Ela percebe a contínua expressão de confusão nele, e tenta ser mais clara.

- Ele desistiu de nós. Como um artista que erra o traço, ele está, agora, apagando. Desistiu de nós e decidiu recomeçar do zero.

Pronuncia as últimas palavras virando a xícara em direção aos lábios, enquanto admira, apaticamente, as sombras no chão se aproximando de si, em efeito de um Sol nascente que, na verdade, começava a se pôr.

Be the Miracle

segunda-feira, junho 16, 2008 Comments Off

"Be the miracle", escrito graciosamente em caneta bic azul sobre o post-it, que agora se encontrava grudado num cantinho da tela do computador do outro, que fica com um secreto sorriso no canto dos lábios ao ler as sutis palavras, com a gostosa sensação de ter a chance de fazer tudo dar certo desta vez.

Antes Que Você Perceba Ser Humano

sábado, junho 14, 2008 Comments Off

Vou viajar pelo mundo, e abraçar corpos desconhecidos como fossem meus amantes de 20 anos de história.

Entrar em casas às quais nunca fui convidado e me sentar à mesa da cozinha falando sobre a novela local, esperando gentilmente que me sirvam um café, ou, oferendo-me pra tal.

Vou pegar as chaves, ajeitar o banco, e dirigir sem noção de tempo, espaço, vida, universo e tudo o mais, como fosse um jogo de vídeo game, daqueles que a gente senta e não desgruda até ter a certeza de que, enfim, acabou. E depois ainda volta e começa tudo outra vez, com a mesma paixão de antes.

Vou me apaixonar pela morena que cruzar na próxima rua à direita. Me casarei com ela, viveremos felizes para sempre, até quando não quisermos mais. E então me apaixonarei de novo, inconseqüentemente, por outras morenas, morenos, cachorros e alienígenas que a vida jogar sobre mim.

Inconseqüentemente.

Sem parar pra pensar, ou estudar, ou refletir. Apenas ir. Viver. Sem valores e regras e livros e métodos e formatos que tentem aplicar a mim. Sem valores alheios. Vou seguir a vida aos meus valores, ou até sem qualquer valor, ou moral, ou ética, ou qualquer coisa que me limite a... não viver.

Inconseqüentemente.

Vou me preocupar mais em ser feliz. Ignorar os olhares do mundo, e as expectativas sobre quem sou de pessoas que não são eu. Que não são eu. Vou me preocupar em viver.

Inconseqüentemente.

Virarei à esquerda quando tiver de virar à direita, e esperar encontrar o amor como num filme bonitinho onde tudo sempre dá certo. Tirando a parte onde tudo dá certo. Não quero que nada dê certo. Quero que aconteça. E que siga em frente. Quero crescer com cada tropeço, choro e despedidas que tiver de dar nessa vida. Todas as despedidas que tiver de dar nessa vida.

Vou parar de me preocupar em falar o correto, o belo, o esperado, o inteligente. Vou xingar e espernear por aquele que me abandonar, tudo pra crescer, e seguir em frente depois.

Vou virar jogador de futebol.

Talvez a predisposição a ser absolutamente nada do que eu pretendo me faça justamente ser o que eu deva ser. E não compreender de forma alguma o que essa frase diz é absolutamente compreensível e faz totalmente parte da arte de ser o que quiser ser, e ouvir o que quiser ouvir, e viver o que quiser viver.

Vou virar jogador de futebol, e abandonar a língua portuguesa, e cometer os maiores crimes gramaticais.

Será que, talvez, assim a gente se torne uma pessoa feliz?

O que pode me fazer uma pessoa feliz?

Vou aceitar os convites que me fizeram, terminar esse texto, e mostrá-lo a vocês. Talvez, assim, eu me torne uma pessoa feliz.
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